Guia da contraceção no pós-parto: métodos e timings

Estás a amamentar e queres evitar nova gravidez? Conhece os métodos seguros e os timings de contraceção no pós-parto.

Guia da contraceção no pós-parto: métodos e timings

Vamos refletir juntas sobre contraceção no pós-parto? É um tema frequentemente esquecido no meio da gravidez, do parto e da receção do bebé. A minha intenção aqui é oferecer-vos um resumo prático do que considerar, o que está disponível, e como decidir de forma consciente, sempre lembrando: esta leitura não substitui a consulta personalizada com a vossa médica assistente. Cada mulher tem a sua realidade e as decisões devem ser tomadas com acompanhamento clínico.


O que é a contraceção no pós-parto e por que planear já

Idealmente, esta conversa começa nas consultas pré-natais. No puerpério é mais difícil decidir: há cansaço, dúvidas e, às vezes, pressões. Antecipar ajuda a chegar ao pós-parto com um plano claro — e, em alguns casos, certos métodos exigem organização prévia para estarem disponíveis no momento certo.

Também há situações em que o acesso à consulta pós-parto pode ser incerto; aí, por vezes optamos por métodos que garantam proteção imediata, se essa for a vontade da pessoa. O objetivo é simples: que só surja uma gravidez quando for o vosso plano.


Quem deve priorizar este planeamento

Todas devemos pensar nisto — mas há grupos em que é ainda mais crítico: mulheres muito jovens, quem teve complicações na gravidez/parto que exigem intervalo maior antes de nova gestação, e pessoas com comorbilidades (p. ex., hipertensão, diabetes) que beneficiam de estabilização antes de engravidar novamente.


Intervalo ideal entre gravidezes

Há recomendações que apontam para cerca de 18–24 meses entre gravidezes por potenciais resultados materno-fetais mais favoráveis, mas isto é controverso e muito dependente do contexto e do acesso a cuidados de qualidade. Em todo o caso, pode ser útil um intervalo que permita gestão familiar e adaptação ao bebé. Pensem também no impacto da idade materna e paterna na fertilidade e nos desfechos, para evitar arrependimentos.


Quando vou ovular no pós-parto?

A ovulação pode regressar cedo e é variável de pessoa para pessoa. Em quem não amamenta, a primeira ovulação pode surgir entre 45 e 94 dias, podendo acontecer tão cedo quanto 5 dias após o parto (raro, mas possível). Ou seja, pode ocorrer antes da consulta das 4–6 semanas — e há estudos a mostrar que muitas mulheres reiniciam a vida sexual antes dessa consulta.

Durante a amamentação, a ovulação tende a regressar mais tarde, mas pode surgir sem que a menstruação tenha voltado (engravidar antes da primeira menstruação é possível!). Métodos de monitorização do ciclo menstrual existem, mas no pós-parto imediato podem ser desafiantes, sobretudo para quem não tem experiência prévia.


Estrogénios no pós-parto: quando evitar devido ao risco de trombose (TEV)

No período de pós-parto aumenta o risco de tromboembolismo (TEV) — máximo por volta da 3.ª semana, elevado até 6 semanas. Por isso, evitamos contracetivos com estrogénios neste período precoce. Métodos só com progestativo não parecem aumentar o risco, mas, por prudência, muitas orientações adiam o início para depois do 21.º dia. A decisão é sempre individual, ponderando riscos e benefícios.


Amamentação e contraceção: progestativo vs combinado

A pergunta clássica: os contraceptivos hormonais prejudicam a amamentação? Para progestagénios, a conhecida pílula da amamentação, os estudos não mostram impacto clinicamente relevante de forma consistente; ainda assim, há quem prefira opções não hormonais nos primeiros tempos para “otimizar” a amamentação, sobretudo se houve dificuldades anteriores.

Já os combinados (estrogénio + progestativo) variam conforme recomendações: há instituições que só os consideram após 3–6 semanas (sem outros fatores de risco para TEV) quando não se amamenta, e, em quem amamenta, preferem após 6 meses pelo potencial de redução da produção de leite.

🧠 Contraceção e depressão pós-parto: o que sabemos Não há evidência de que métodos hormonais aumentem ou diminuam o risco de depressão pós-parto; o essencial é rastrear e tratar adequadamente, sem hesitações nem medos.


Métodos contraceptivos no pós-parto: eficácia, prós/contras e timing de início

Não existe “o melhor método para toda a gente”; há o melhor método para cada mulher, em cada fase da vida. O que costuma pesar:

  • Eficácia (falhas reais vs uso perfeito)
  • Conveniência (diária ou longa duração)
  • Acesso/custo (alguns métodos são gratuitos no SNS)
  • Preferências pessoais (método “on-demand”, como os métodos barreira)
  • Efeitos não contraceptivos (alteração de fluxo, spotting, outros benefícios clínicos)
  • Compatibilidade com a amamentação
  • Condições clínicas individuais (elegibilidade)
Método Quando iniciar Eficácia (uso habitual) Compatível com amamentação? Notas principais
LAM (amenorreia da lactação) <6 meses + amamentação exclusiva + sem menstruação ~98% Deixa de proteger se algum critério falhar
Preservativo Imediato 80–85% Protege também ISTs
Pílula só progestativo ≥21 dias ~91% Spotting possível nos primeiros meses
Implante subcutâneo ≥21 dias (pode ser imediato) >99% Longa duração
Injetável trimestral ≥21 dias (ou imediato em contextos especiais) >99% Necessita reaplicação trimestral
DIU de cobre / SIU hormonal Imediato ou ≥6 semanas >99% Expulsão maior se colocado logo após o parto
Combinados (pílula/anel/adesivo) 3–6 sem (não amamentar) / ≥6 meses (amamentar) ~91% ⚠️ Evitar cedo devido a TEV e impacto na produção de leite
Esterilização / vasectomia Imediato (se planeado) >99% Definitiva, requer consentimento antecipado

Contraceção de emergência a amamentar: DIU de cobre vs ulipristal

  • DIU de cobre: pode ser colocado nos dias seguintes a uma relação desprotegida; é altamente eficaz e compatível com amamentação.
  • Pílula do dia seguinte (ulipristal): o fabricante recomenda evitar amamentar nas 24h seguintes, mas há pareceres que a consideram compatível pelos níveis sistémicos baixos. Discuta com o profissional de saúde que a acompanha o melhor plano na sua situação clínica.

Planeamento familiar no pós-parto: próximos passos

  1. Clarifique objetivos: tamanho de família e timing para o próximo filho.
  2. Liste prioridades: eficácia, comodidade, impacto no ciclo, compatibilidade com amamentação.
  3. Converse em consulta: leve dúvidas e o seu histórico (incluindo experiências prévias).
  4. Não tem de acertar à primeira: ajustar é parte do processo.
  5. Quando retomar a atividade sexual: idealmente após avaliação clínica ou quando se sentir confortável — a contraceção pode e deve estar já planeada.

FAQ — Perguntas frequentes sobre contraceção no pós-parto

Quando posso ovular no pós-parto? Sem amamentação, a ovulação pode regressar entre 45–94 dias e, raramente, tão cedo quanto 5 dias. Em amamentação, pode também ocorrer antes da primeira menstruação.

Qual é o melhor método contraceptivo a amamentar? Métodos só com progestativo e os não hormonais (DIU de cobre, preservativo, LAM) são os mais compatíveis.

Quando colocar DIU depois do parto (imediato ou às 6 semanas)? Se houver bom acesso a consulta, prefiro após 6 semanas (mais confortável e menos complicações). Se o acesso é incerto, pondera-se a colocação imediata após o parto.

Posso tomar pílula combinada a amamentar? Quando? Idealmente, após 6 meses, pois o estrogénio pode reduzir a produção de leite. Se não amamentar, pode considerar-se entre 3–6 semanas após o parto.

O que é o método LAM e quando deixa de proteger? É o método da Amenorreia da Lactação: protege se <6 meses, sem menstruação e amamentação exclusiva. Falhando algum critério, deixa de proteger.

Qual a contraceção de emergência no pós-parto? O DIU de cobre é o método mais eficaz. A pílula com ulipristal pode ser usada, mas recomenda-se pausa de 24h na amamentação (ou discutir essa situação com o seu médico).


Cuidem de vocês, façam escolhas informadas e lembrem-se: não precisam de acertar à primeira. O importante é encontrarem o método que vos deixa seguras e tranquilas nesta fase tão intensa.

Mariana Torres
Mariana Torres

Médica pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, tendo concluído em 2018 a especialidade de Ginecologia e Obstetrícia no Hospital Garcia de Orta. Realizou o curso de Aconselhamento em Aleitamento Materno (OMS/UNICEF) e o curso de Doula pela Nurturing Birth. Criadora da página @marianatorres_ob e autora do livro “O que é que se passa aqui dentro?”, um guia da pré-concepção ao pós-parto. Fundadora da Clínica Matriz.

Publicado em 11 de novembro de 2025

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